Luto e alívio

Dia dos Pais foi meio vazio. Passei em minha cidade natal depois de um adeus ao único avô que conheci: vô Élice de Melo. Seu Élice. Lice. Um avô típico, de bigode, chapéu e pancinha. De tirar longos cochilos no sofá e de gostar de ouvir Roberto Carlos.

Um ano doente e em tratamento contra o câncer. Mesmo não tendo jeito, fizeram o que se podia. Mas não quero falar dos seus últimos meses de morte. E sim, dos seus fortes anos de vida.

Dizem ser dele a inteligência dos netos, felizes no que fazem com letras, números ou fórmulas químicas. No meu caso, herdei as pernas arqueadas e o amor incondicional por bichos (tá, esse último é de todos também). Curioso que era a única pessoa da vida a me chamar somente pelo segundo nome: Carolina. Carolina do Brasil.

Lembrança de vô tem gosto de infância. Dos cruzeiros pra comprar bala na mercearia do seu Sinfrônio, do abacate amassadinho com açúcar que só ele sabia fazer, de subir na laje pra apanhar goiaba – sim, na laje – e esperar setembro pra colher amora no pezinho. E tem também o Natal, época de sair com o vô  e o serrote pra arranjar a árvore.

Vôzinho. A cada beijo no rosto retribuía com um “brigado”, como se carinho fosse lá algo pelo que agradecer. Gostava de Coca-Cola, de sorvete e de agrados. Era de praxe levar uma coisinha gostosa pro casal de velhinhos, fosse empadinha ou qualquer outro salgadinho feito na hora pela amiga da mãe. “Toma papai. Esse é seu e esse é da mamãe, pra não ter briga”. Sempre achei lindo ver minha mãe e seus irmãos chamá-lo assim. Papaaaaaaai!

Tinha hábitos boêmios. Trocava o dia pela noite e, fosse qual fosse o evento, sempre chegava atrasado. Só aceitou a carequice obrigado, em seus últimos meses. Até então, puxava o que tinha atrás pra frente e prendia com grampo, num ritual de beleza mais demorado que o de qualquer perua. Figura!

Há uns anos, ganhou do Jôta (Jônatas para os menos íntimos), primo mais velho, um terno. E pra não perder a elegância, usava nas ocasiões que podia: dia dos pais, Natal, dia dos pais de novo. Lia compulsivamente. Com oportunidade, teria sido grande professor. E como gostava de ensinar, falava por demais. Afinal, tinha sua cota de palavras pra “gastar” por dia. Eu bem deveria tê-lo ouvido mais.

Era chegado num jogo do bicho e tinha mania de contar passos. “Carolina, daqui até sua casa são x passadas largas”. E assim a gente achava graça.

Não vou me esquecer de nossa despedida, que a gente nem sabia que era, mas era. Tem pouco mais de duas semanas. Ele perguntou por mim enquanto eu estendia roupa. “Ana Carolina, vem cá que o vô tá te chamando”, gritou minha mãe. Eu fui, sentei perto dele. “Que foi, vôzinho?”. Ele me olhou um tempinho e disse o mais doce: “bonita!”. E assim foi que me elogiou pela primeira e última vez. E foi assim que não nos vimos mais.

Dói que ele não está mais com a gente, que não vou chegar na porta de sua casa e ouvir seu “oi” comprido, mas sou grata por todas as histórias leves e gostosas que sempre me fazem lembrar o quanto cresci no meio de tanta simplicidade e alegria. Que a gente nem precisa de muito pra ser feliz. Não vê-lo sofrendo conforta a mim e a todos que o amam. E já não me preocupo porque sei que, onde está, não há mais limite de palavras… Nem de passos. E também garanto que não está mais careca!

Até mais, vô!

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Piquenique + jazz

Um dos eventos de que mais gosto em BH está chegando: o Festival I Love Jazz.  Gosto da música, do ambiente, de observar as pessoas estilosas…

Ano passado, uma amiga resolveu fazer sua despedida pré-intercâmbio no último dia do festival, domingo. A coisa toda foi tão legal que, mesmo sem despedida, vamos repetir o encontro.

E já que é ao ar livre, fica o convite pra quem é de BH e quiser passar por lá. Vai ter toalha xadrez, conversa boa e, se o tempo permitir, até um solzinho se pondo. Só levar sua bebida e belisquetes.  Domingo, 05/08,  a partir das 17h, na Praça do Papa.

A programação completa você encontra aqui.